Letra
(João Tamura)
Com a demasia da vida, qual a melodia que toca a partida?
A casa é uma arena vazia onde se arrasta aquilo que em mim cabia...
Na outra face do sol: navegamos em barcos sem mastros.
Incendia, amor, todo o meu rasto - assim como chocam os astros.
Sabemos a vida de cor, vale todo o mal e eu não quero mais.
Sei o lugar vil onde vais, ensina-me aquilo que sabes a mais.
Os amantes não têm momento: o sentimento, o falso, a perda...
E tu reza onde o mal reza, presa, ou arde como uma estrela.
E o grão de filme, e o chão vil, e o mal de nós - eu sei.
As limitações são o corpo, eles querem-me morto - é aquilo que é lei.
E sobrevivemos com pouco. Desliga a TV, olha que ela te engana.
E onde é que eles arranjam esses palhaços que em nós mandam?
Não é onde eu cresci, onde eu estudei, eu sei o que eu valho.
As botas e mãos que pisam os cravos ditam os ordenados...
Presos na culpa do fado, nos olhos vendas, vende o tempo,
cresce a renda, não a vida, vale tão pouco aquilo que temos...
Falo do pouco daquilo que temos,
canto o sufoco daquilo que vemos.
Presos no negro do fado, venda a face e vende o Tejo.
Cresce a renda, não a vida, vale tão pouco aquilo que temos...
(Miguel Cruz)
São difíceis estes tempos para te amar.
Sou eu e tu e à nossa volta não há luz.
Peço forças para te agarrar e não largar.
Mas não sei bem a quem...
Não sei quem se esconde por trás deste caos,
que brinca com a vida e a morte como lhe convém.
Até que a dor desfaça o nó das nossas mãos...
Preciso de ajuda, já não sei ver.
Troquei os meus olhos pelas mãos e perdi a tua.
Já não tenho norte deste mar sem maré.
E deixo-me levar por uma alma nua...
Que me seduz e me faz acreditar
que não sou ninguém...
(João Tamura)
Os dias agarram-se à pele: uma casa que de nós nunca sai.
Os dias que rasgam a pele: uma doença que de nós nunca vai.
As noites que passamos à margem, sabemos que o mar é selvagem,
decoro a tua imagem, para quando mais tarde me for.
Trabalho naquilo que for, naquilo que é dor, naquilo que der...
Sabemos tão bem essa cor, mas nunca o sabor da neve.
Lá fora falamos da greve... Mas creio que nunca acontece.
À medida que o mundo nos cresce das mãos para fora chega à hora
de dizer adeus, tudo em nós em breve...
Escrito e interpretado por João Tamura e Miguel Cruz;